Uma das maiores revendedoras de relógios do país, com Rolex, Cartier, TAG Hauer e agora Tudor, quer dobrar de tamanho em cinco anos
Por Ivan Padila*
Quem acompanha o mercado de joias e relógios tem na Montecristo uma referência, com uma reputação construída ao longo de mais de 60 anos. Mas quem vê a solidez do lado de fora da joalheria talvez não imagine o momento efervescente pelo qual a empresa familiar vem passando – e a ambição dos próximos passos.
Os atuais sócios, os irmãos Marcelo e Nelson Semeoni, junto com a esposa de Nelson, Patrícia, se preparam para passar o comando da empresa para a terceira geração familiar. Rodolfo, filho de Marcelo, e Nelson Neto, filho de Nelson, já estão trabalhando na Montecristo e se preparando para a mudança de gestão.
Rodolfo e Neto começaram a trabalhar na empresa no começo de 2022. Com poucas semanas de casa embarcaram para a edição do ano passado do salão Watches & Wonders, em Genebra, a maior feira de relojoaria de luxo, em que revendedores do mundo conhecem as novidades do ano e fazem os pedidos para as marcas. Foi um batismo e tanto.
Conheça a nova geração
Nelson Neto tem 34 anos. É formado em administração de empresas, fez pós em economia financeira, começou a carreira em consultoria e passou oito anos na Ambev. Seu último cargo por lá foi diretor financeiro da divisão de não-alcóolicos.
Rodolfo está com 27 anos. Começou como estagiário de uma startup pequena e virou executivo de contas. Três anos depois, a empresa foi vendida. Depois ele trabalhou no iCarros, revendedora automotiva que trabalha online. “Acompanhei nesse tempo como se monta um time comercial, como se trabalha o CRM”, diz.
A nova geração chega em um momento em que os consumidores também são outros. “Antes, a cada dez clientes que entravam na loja, o Marcelo conhecia nove. Hoje, conhece um”, diz Rodolfo. “O dinheiro está mudando de mão, o mercado é dinâmico”.
O início da Montecristo
Nelson Semeoni começou a trabalhar como office boy de uma joalheria no centro de São Paulo, até ser ajudado pelo antigo patrão para abrir própria relojoaria. Nascia assim a Montecristo, em 1961. E por que o nome? “Por causa do filme, né. Montecristo era famoso pelo baú de jóias. O nome é muito forte, impressiona”, conta Marcelo.
O filho de Nelson lembra como entrou para o negócio da família. “Meu pai foi com meu irmão, que também se chama Nelson, para o mercado financeiro, lá por 1981, 1982. Um pouco depois eu fui convidado a participar da empresa. Eu terminei a faculdade de direito e comecei na Montecristo. Em novembro faço 40 anos de empresa.”
Desde pequeno Marcelo acompanhava o negócio. “Quando entrávamos de férias meu pai colocava a gente para trabalhar nas lojas. O final de ano era muito concorrido. Fazíamos pacotes, entregas.”
O momento de expansão
Naquele tempo a família tinha a loja no centro e uma no shopping Iguatemi, em São Paulo, que era tocada pela mãe de Marcelo. Oito depois de ter começado a trabalhar no negócio familiar Marcelo comprou a joalheria do centro. Em 1999 ele abriu outra loja no shopping Anália Franco, na zona leste da capital paulista.
Nesse período o irmão de Marcelo voltou para o ramo e abriu outra loja no shopping Jardim Sul. Naquele momento, conta Marcelo, a família começou a ter dificuldade para tocar a loja do Iguatemi.
Foi nesse momento que Marcelo, o irmão Nelson e sua esposa Patrícia unificaram as joalherias e formaram a sociedade no formato atual. Em 2012 eles inauguraram a loja do JK Iguatemi com a Rolex, com quem já têm parceria desde os anos 1960. Depois, voltaram a trabalhar com Cartier, como já havia acontecido no passado. Até que a loja ganhou para um novo espaço no piso térreo, onde ficam as grandes grifes internacionais.
Menos lojas, mais qualidade
A nova loja do JK Iguatemi foi um marco. “A diferença foi grande, mudou realmente o público, fomos para um mercado de luxo mesmo”, diz Marcelo. Nesse novo posicionamento, a família Semeoni foi fechando as outras lojas, no Anália Franca e no Jardim Sul, para focar no JK Iguatemi. Até que recentemente veio o convite para abrir um novo ponto no shopping Iguatemi de Campinas, no interior de São Paulo.
“No shopping Iguatemi mesmo a gente não conseguia fazer uma expansão devido ao lugar, à localização da loja, não conseguíamos deixá-la com as mesmas características que vinham fazendo tanto sucesso na loja do JK”, afirma Marcelo. “No Iguatemi de Campinas tivemos condições de seguir o mesmo modelo, o mesmo padrão.”
As operações foram quase simultâneas. Em setembro de 2022 eles fecharam a loja no Iguatemi e em dezembro de 2022 abriram a do Iguatemi Campinas. “Pouco antes os novos sócios, o Rodolfo e o Nelson Neto, já haviam sido incorporados, e estamos nesse momento agora.”
Planos de dobrar o faturamento
A empresa não abre números, mas está entre as cinco maiores distribuidoras de relógios do país, considerando as marcas comercializadas, que são Rolex, Cartier e TAG Heuer. As lojas serão reformadas em breve para dar espaço também para a Tudor, marca que pertence à Rolex.
Do total de faturamento, 40% vêm das joias, que são desenhadas internamente, e 60% de relógios. Em ordem de faturamento estão Rolex, depois joias, Cartier e TAG Heuer.
A meta é dobrar o tamanho em cinco anos, quando terminar o plano de transição de gestão. Nesses dois anos, com Rodolfo e Nelson Neto, a Montecristo cresceu dois dígitos. Não estão atrás de novos pontos de venda, mas não descartam outras lojas.
“Temos vontade de expandir, mas com qualidade, como foi a abertura da loja de Campinas”, diz Neto. “É a nossa ambição, não vamos negar.”
Momento certo para a transição
A transição de comando parece estar acontecendo com muita suavidade. “Depois de 40 anos de gestão a gente começou a pensar para onde a empresa iria caminhar”, conta Marcelo. Com a nova loja de Campinas, ele e o irmão perceberam que precisariam de sangue novo para tocar a Montecristo dali por diante.
“Tínhamos duas alternativas. Poderíamos trazer um executivo de fora ou poderíamos buscar reforços dentro da família”, diz. Os filhos então foram convocados para uma conversa. Rodolfo e Nelson Neto têm um irmão cada, que preferiram não entrar no negócio.
“Apesar de gostarmos muito do mercado, não era uma coisa para a qual estávamos olhando. ‘Ah, daqui a um ano eu vou, daqui a dois anos eu vou para empresa da família’”, diz Rodolfo. “Eles nos chamaram em um momento em que pensamos que essa mudança fazia bastante sentido.”
“Nós tivemos a bênção de ter na estrutura dois jovens profissionais que estudaram e se formaram em empresas do mercado. E coincidentemente um filho de cada sócio”, diz Marcelo.
Ajuda de consultoria
O plano de transição de gestão é de cinco anos. Os sócios contrataram uma consultoria para ajudá-los a fazer a mudança. O passo seguinte será a transição societária. A primeira fase foi de alinhamentos gerais, de missão, de valores. A segunda etapa já entra no planejamento estratégico.
Os novos integrantes do time não têm cargo definido. Eles se dividem por responsabilidades. Nelson Neto está com a operação financeira e o time comercial. Rodolfo ficou digital, marketing e produção de materiais.
“Não adianta trazer alguém só porque é da família”, diz Marcelo. “Essa coisa acabou. Na minha geração vi muitas grandes empresas se acabarem. O negócio vai mal e a família briga. É uma consequência.”
O plano da nova geração que chega agora é terminar o centenário da empresa, que será comemorado em 2061. E depois disso? Só o tempo, essa dimensão abstrata medida pelos ponteiros de um relógio, dirá.
*Ivan Padila para Exame