Um ponto importante na segunda geração da empresa é quando ela é uma organização com várias famílias
Por Armando Lourenzo
Na primeira geração no comando três aspectos são relevantes para o sucesso das empresas familiares: fundadores e fundadoras no comando, empreendedorismo e conflitos administrados pelos pais.
Na segunda geração estes mesmos aspectos podem ser diferentes: o empreendedorismo dos fundadores pode não existir (não é transmitido simplesmente pelo DNA), irmãos e primos no comando com valores diversos, conflitos para serem administrados sem a presença dos pais e muitas vezes sem uma liderança natural.
Outro aspecto a ser lembrado é que a sucessão não ocorre somente nas dimensões gestão e sociedade, mas na família também. Quando a família tem um membro preocupado com todos os familiares, mediando os conflitos e mantendo a ligação entre todos os membros da família a situação tende a ser mais harmoniosa. Quando ela não está mais presente, os relacionamentos familiares podem piorar, pois os conflitos serão administrados por irmãos e primos geralmente permeados por mágoas do passado.
Um ponto central nos conflitos reside nos valores das pessoas. Quando se tem uma família com pais e filhos é possível que os valores sejam os mesmos. Mas os irmãos casam e formam novas famílias e muitas vezes com diferentes valores em relação a família dos seus pais.
É dificílimo mediar conflitos com valores distintos. Ideias diferentes fazem parte do cotidiano das pessoas. Você gosta do azul, ele do verde e uma terceira via pode ser achada: amarela. Com valores é bem diferente. A pessoa tem a crença sedimentada nos valores dela e achar um ponto comum na gestão conflitos ou mesmo nas mudanças de visões, não é uma tarefa fácil.
As mágoas e mesmo o ciúme entre os irmãos vêm à tona e aumentam os conflitos. Tentar mediar os conflitos somente com argumentação racional pode não melhorar a situação. Problemas baseados na emoção não são resolvidos somente pela razão, são necessárias ações comportamentais para resolvê-los.
Um ponto importante na segunda geração da empresa é quando ela é uma organização com várias famílias. Os sócios criam uma empresa por terem profissões iguais como dois professores que montam uma escola ou dois engenheiros uma construtora.
A empresa não começa familiar, mas com o passar do tempo os filhos de todos os sócios vão entrando e ela se torna uma organização com várias famílias e valores distintos.
Um fato importante é que os sócios fundadores entraram no mesmo dia, provavelmente tiveram a oportunidade de escolha, mas sairão da sociedade em períodos diferentes. Portanto os filhos de um sócio trabalharão com os outros sócios. Neste caso existirá uma nova sociedade que não se escolheu.
Além dos conflitos naturais da sucessão teremos neste caso os conflitos geracionais e os novos sócios poderão chegar na sociedade como uma visão não verdadeira dos outros membros da nova sociedade, pois os filhos conhecem os novos sócios pela visão dos seus pais e pode não ser a correta.
Na empresa familiar, quando os pais vêm a faltar, esta nova sociedade entre os irmãos precisa ser criada e sedimentada, até porque os irmãos não foram preparados para serem sócios, em muitos casos foram desenvolvidos somente para a gestão das empresas como sucessores.
Os conselhos societários são um espaço muito importante para a construção deste novo tipo de relacionamento entre os herdeiros. A nova sociedade deve ter seu início preferencialmente com os pais vivos para que eles possam ajudar os filhos a se relacionarem como sócios com base na longa experiência que os fundadores adquiriram. Esta nova construção da sociedade será longa e deve ser exercitada frequentemente. A cada dia um novo aprendizado no relacionamento entre os sócios. Reflita sobre isto.