FENINJER+

“O sucesso da Cartier está em criar peças bonitas para pessoas de hoje”

“O sucesso da Cartier está em criar peças bonitas para pessoas de hoje”

“O sucesso da Cartier está em criar peças bonitas para pessoas de hoje”

Relógios precisam ser perenes e elegantes em qualquer circunstância, diz Pierre Rainero, diretor de imagem e herança da maison francesa

Por Ivan Padilla*

Divulgação Cartier

Não é exagero dizer que Pierre Rainero é prata da casa, no caso a maison de joalheria e relojoaria Cartier. Ele começou a trabalhar na empresa há quase quatro décadas, em 1984.

Começou na área de comunicação, foi diretor de marketing, passou por outros cargos e países até assumir a diretoria de imagem e herança da marca, na sede em Paris.

Antes disso, Rainero esteve no Brasil como estagiário e depois pela agência de publicidade em que trabalhou. Tem um irmão que mora no Rio de Janeiro e fala um pouco de português. Mas na entrevista a seguir, concedida durante o salão Watches & Wonders, em Genebra, no começo de abril, preferiu falar em inglês.

A Cartier vive um ótimo momento. No ano passado, suas vendas somaram 2,4 bilhões de francos, um crescimento de cerca de 40% em relação a 2020, segundo relatório da indústria do Morgan Stanley em colaboração com a consultoria suíça LuxeConsult. Com isso, a marca ficou em segundo lugar em share de mercado, atrás apenas da Rolex.

Parte do sucesso da Cartier se deve à capacidade de transmitir elegância até em circunstâncias casuais, de acordo com Rainero. A seguir os principais trechos da entrevista.

Qual a função de um departamento de imagem e herança?

Nós trabalhamos no processo criativo, do mesmo jeito que foi concebido em 1920. Temos um comitê criativo, formado por designers que propõem suas criações, uma pessoa do departamento comercial e um responsável pela manufatura, que pode ser de relojoaria ou de joalheria. É do mesmo jeito hoje. E existe um presidente desse comitê, que hoje sou eu.

Você está na Cartier há quase 40 anos. O que mudou na imagem da marca nesse tempo?

O que basicamente mudou foi o tamanho da empresa. É interessante porque eu acho que essa devia ser a mesma sensação que tinham as pessoas do começo do século 20.

Naquele tempo a Cartier era a marca mais importante de joalheria do mundo, estávamos presentes com nossas subsidiárias em Londres, em Nova York, China, Irã, América do Sul, no mundo todo. Em 1910 era possível ter uma carreira internacional na Cartier. Os funcionários naquele tempo costumavam chamar a empresa de “a firma”.

Cada linha de relógios tem uma persona, um tipo de cliente. Como isso é definido?

Na verdade, quando trabalhamos em uma linha não levamos isso em conta. Isso acaba sendo um trabalho de comunicação. A cultura da companhia é trabalhar a beleza do objeto como ele é. Claro, parte do processo é questionar a relevância do design para as pessoas de hoje, não simplesmente fazer peças bonitas. Parte do nosso sucesso é criar peças para as pessoas de hoje.

Mas não fazemos pesquisas para saber o que os clientes querem. Temos confiança de que se um relógio é bonito, consistente com nossa filosofia e apropriado para os nossos dias, sabemos que estamos no caminho certo. Não entramos no detalhe de entender a personalidade do cliente. Ou mesmo gênero. O Tank é um relógio para ser usado por homens e mulheres.

Mas você pode imaginar quem usaria um Santos, um Tank…

Sim, você pode. Quando você tem um Santos com pulseira de metal, pode imaginar em que circunstância um cliente usaria. Eu posso usá-lo na academia, quando eu saio eu posso trocar por uma pulseira de couro, à noite eu uso meu Tank.

Por que faz sentido usar relógios mecânicos hoje?

Você poderia fazer a pergunta contrária. Por que nós fazemos relógios de quartzo? Eu estava esperando essa pergunta (risos). Depois do período do quartzo, quando todos achavam que as manufaturas tradicionais estavam mortas, aconteceu justamente o contrário. Relógios tradicionais ganharam ainda mais valor, com movimentos mecânicos, metais preciosos.

Desde aquele período, as manufaturas tradicionais nunca estiveram em um momento melhor. Demorou um pouco, mas depois a qualidade voltou a ser valorizada. Então você poderia pensar: por que quartzo? Por conveniência. Muitas pessoas usam relógios a quartzo poque é conveniente, não é preciso dar corda. Principalmente mulheres. Elas gostam mais do design, da beleza do relógio.

E quanto a smartwatches? Faz sentido para uma marca de luxo entrar nesse segmento?

Estamos falando de perenidade. Por isso temos de tomar muito cuidado quando falamos de tecnologia. Precisamos pensar no futuro das peças, daqui a 25, 30 anos. Se a tecnologia não é mais relevante em poucos anos, o que faremos com o objeto? Essa é a conta que fazemos quando pensamos em evolução. Precisamos prestar um serviço de longa duração para os clientes.

Qual o seu relógio ou linha favorita da Cartier?

(risos) No começou eu pensei que seria duro responder a isso, mas vou responder com clareza. Desde antes de eu entrar para Cartier meu relógio favorito era o Tank, e ainda é. Eu descobri o Tank quando tinha 16, 17 anos. Eu tinha um preconceito de que o design estava ligado à acessibilidade, à conveniência, à utilidade. Com o Tank eu descobri um objeto com um incrível design, muito simples, nenhum relógio poderia ser mais simples, mas ao mesmo tempo muito sofisticado, refinado, muito elegante.

Foi seu primeiro contato com a marca?

Na verdade não. Eu nasci na África, mas voltei com minha família para a França no começo dos anos 1960. Eu tinha uma grande amiga que costumava me visitar em Paris, e a família dela era de clientes muito próximos à Cartier. Minha avó costumava ir a butiques com elas.

Cartier tem uma identidade muito forte, nas diferentes linhas. Esse é um dos segredos do sucesso da marca?

Não só para a Cartier. O sucesso para qualquer marca é a singularidade, a originalidade. E efetivamente, por nossa maneira de concepção de relógios baseada em design, temos mais chance de produzir objetos singulares. Não são relógios minimalistas, de jeito nenhum, não é a ideia. Tudo está no seu lugar, com perfeito balanço, desde a presença de elementos decorativos até a percepção de volume.

Curiosa sua colocação. Normalmente se associa elegância com minimalismo.

Concordo com você. Mas eu relacionaria elegância com essência. É uma nuance em comparação com minimalismo. O Tank, por exemplo, poderia ser minimalista, com uma cor só de caixa, do mostrador, mas então não teríamos a percepção de refinamento.

Se você fosse definir a Cartier em uma palavra seria elegância?

Sim, como consequência do nosso trabalho. Em diversas formas. Você pode pensar em elegância em um certo contexto. Por exemplo, um evento à noite. Mas você pode pensar em elegância em outras circunstâncias. Quando lançamos o Cartier Santos com o bracelete de metal mostramos que é possível ser elegante em circunstâncias casuais. Isso ilustra nossa paixão por ser relevante, por integrar a evolução do modo de vida aos nossos clientes. Não é preciso trocar de relógio três vezes por dia para a exata circunstância. A ideia é trazer elegância em cada momento.

O que você pode dizer sobre a diferença entre o consumidor brasileiro e o europeu?

Acho que é difícil falar em um consumidor brasileiro, seu país é muito grande. Vocês não vivem da mesma forma em Fortaleza e em São Paulo. É difícil dizer… o contexto é diferente, as cidades são diferentes, a interação. Até onde eu sei, há uma curiosidade sobre marcas centenárias, com muita história, muita herança.

* Ivan Padilla, de Genebra, para a Exame

Compartilhar
plugins premium WordPress
Rolar para cima