O novo “velho” hype do varejo
Por Camila Salek*
Entra ano e sai ano todo o mercado espera a NRF, maior evento mundial de varejo, para entender qual será o novo hype. Como meu foco de atuação é o varejo, a NRF funciona como uma confirmação de caminhos para mim, dificilmente volto com grandes e novas provocações sobre próximos passos, porém sempre exercito o cruzamento do meu olhar com o de tantas mentes brilhantes e busco entender as rotas construídas.
Preciso começar dizendo que não acredito em um movimento negativo para 2023. Claro que ainda vivemos momentos incertos, o mercado continua extremamente volátil e a insegurança bloqueia muitas apostas de marcas e executivos, mas a urgência de regeneração no varejo é tão necessária que grandes mudanças precisam ocorrer nos próximos anos. O foco agora é sobre a ação e, na minha opinião, o realismo positivo é a chave para fazer acontecer.
No meu processo como curadora de tendências em varejo, procuro olhar com profundidade para pessoas e comportamento de consumo para conseguir identificar o que as está impulsionando. Ao entender as entrelinhas presentes em mudanças, muitas vezes intangíveis da consciência coletiva, fica bem mais fácil identificar a base para alicerçarmos negócios que os atendem bem. Vou propor um exercício simples aqui, compartilhando de forma rápida um pouco das minhas análises e acrescentando esta lente realista positiva que citei acima.
Vamos pensar em três movimentos e nos prováveis impactos no varejo:
1. Queda de heróis
Há muitos anos, investimos nossa crença e confiança no fato de que alguns indivíduos tem o poder de nos salvar. Estes indivíduos supostamente ditam regras e caminhos que são seguidos por legiões em todo mundo. Porém, o que vimos nos últimos anos, mostra muita descrença neste formato. A confiança em líderes políticos em todo mundo despencou, gurus do bem-estar tiveram seu lado sombrio relevado e até o “mestre” dos novos negócios Elon Musk teria ganho muito mais se tivesse ficado de boca calada nos últimos tempos. As auréolas de anjos salvadores caíram! Este mesmo movimento está acontecendo em diversas organizações varejistas, o que leva ao movimento complementar de devolver o poder às pessoas. Empoderar novamente as pessoas é mandatário para os negócios. É uma grande mudança do “eu” para o “nós”, passando a mirar em ações mais reais e concretas.
2. Novos modelos de consumo
Diante da inflação e da incerteza econômica, os consumidores estão mais cuidadosos sobre como gastam. Modelos alternativos de consumo, incluindo moda de segunda mão e serviços de aluguel, estão aumentando sua participação no mercado, embora ainda não se saiba se esses modelos de negócios são escaláveis e lucrativos. Como reflexo vejo o crescimento do olhar de grandes marcas varejistas, algumas delas em estágio avançado de implantação, para novas possibilidades de consumo que incluem práticas de aluguel, revenda, upcycling, assinaturas etc.
3. Online e Offline
Um outro olhar é sobre o boom das vendas online durante a pandemia, que agora voltam à sua trajetória mais lenta e pré-pandêmica. Muito deste movimento reflete o impacto do retorno das lojas físicas. Para mim, é muito claro que à medida que os consumidores voltam às lojas físicas, novas expectativas em relação ao ambiente e ao serviço precisam ser desenvolvidas. É como se devolvêssemos o varejo físico para o lugar que ele nunca saiu: o coração da conexão entre pessoas e marcas.
Deu para entender? De forma prática, movimentos culturais e comportamentais geram ondas que sempre refletem em consumo. Neste contexto, separei para o final uma das mensagens mais fortes da NRF sob o meu olhar: a consolidação do papel do visual merchandising no varejo físico. Com o retorno da socialização, somos ainda mais impactados pelos nossos sentidos. A estética, que desde sempre está presente na nossa vida mesmo que nunca tenhamos nos dado conta disto, agora está se expandindo e se tornando mais multissensorial.
Li uma frase do romancista Kim Stanley Robinson que cita o quanto “ficamos paralisados, vivendo no mundo sem senti-lo”. É meio por aí! Não estamos paralisados mais e queremos viver o mundo na sua plenitude. Não à toa, meu tema para 2023 aqui dentro da Vimer é o Varejo Hiperfísico que já abordei em uma coluna anterior. Neste tema aponto para uma inteligência mais multissensorial e aqui o Visual Merchandising ganha um papel essencial para transformar lojas que são espaços de venda em lojas relacionais, que transmitem diretamente ao consumidor aspectos muito relevantes da marca, propósito, produtos e serviços.
Termino com algumas imagens da novíssima House of Showfields aberta no Brooklyn, onde fui recebida pelo fundador Tal Zvi Nathanel para um bate-papo incrível durante minha passagem por Nova York.
Esta loja representa este novo modelo que descrevi acima, onde o descobrir e o explorar fazem parte da jornada. Tudo construído tendo como base o forte impacto em visual e merchandising, soma mais que necessária nos próximos desafios varejistas. É mandatório considerarmos a inteligência sensorial em cada ponto de contato do varejo, lembre-se disso ao traçar a estratégia da sua marca!
*Camila Salek é sócia-fundadora da Vimer Experience Merchandising integrante do grupo de empreendedoras de sucesso do programa “Winning Women Brasil” da Ernst Young e colunista da Harper’s Bazaar Brasil. Referência em varejo e visual merchandising, está por trás de evoluções significativas da experiência de consumo e do desenvolvimento do conhecimento da área, através da implementação de projetos inovadores e compartilhamento de conteúdos ministrados em aulas, palestras, treinamentos e publicações nacionais e internacionais voltadas para moda e tendência. Artigo para Harper´s Bazaar.